quinta-feira, 16 de abril de 2009

Pojeto Salve o Brasil

CRIMES INSIGNIFICANTES

Este foi o título de uma crônica de Contardo Caligaris na Folha de São Paulo do dia 26 de março, discorrendo sobre julgamentos do Supremo Tribunal Federal em 14 casos em que o crime foi considerado insignificante, devendo os processos serem arquivados e soltos os culpados, se por acaso estivessem presos.
Mas, questiona o cronista, o que é crime insignificante? Qual o critério para definir se uma coisa roubada ou destruída é uma bagatela? Afinal, o que é bagatela para um, pode ser de muita valia para outro! Entende o Supremo que se alguém rouba para matar sua fome, ou de sua família, e se o sujeito não apresenta “nenhuma periculosidade social”, deve ser isentado. Assim, continua o articulista, um Juiz de primeira instância, “ponderando alternativas mais morais do que propriamente jurídicas” pode humanamente considerar: “se encarcero este homem, o que pode acontecer com suas crianças? Surge a questão e o dilema: pode a preocupação moral alterar ou substituir a norma jurídica? E cita o dilema de Lawrence Kholberg para medir o desenvolvimento moral das pessoas. Um pai pode roubar remédio se o filho está doente e ele não tem recursos? Pela interpretação do Supremo isto seria um crime insignificante; para Kohlberg a resposta tem uma qualidade moral e, “necessidade ou não, bagatela ou não, roubar é proibido”. Caligaris continua seu artigo (vale a pena ler) tecendo mais algumas observações sobre legalidade, justiça, considerações de foro íntimo, etc. Menciona a preocupação de especialistas em segurança pública pois “vários estudos mostram que o crime se expande lá onde as simples infrações não são reprimidas”, e termina observando que: “Uma sociedade regida pelo foro intimo seria, provavelmente, mais justa do que uma sociedade governada pela letra da lei. Mas será que ela é possível? Será que somos capazes disso, será que somos homens a altura desta esperança? Esta pergunta é, por sua vez, um dilema moral – ao qual, obviamente, não sei responder.”, finaliza Caligaris.
A história da humanidade mostra, exatamente, esta disparidade de opiniões, a insensatez em eterna briga com a objetividade e o bom senso, a cupidez, a ganância e arbitrariedade campeando soltas, como se fossem as diretrizes de toda a atividade humana. A moral e a ética como que se transformam em utopia, a dar razão à pergunta formulada acima: será que somos homens a altura desta esperança?
Voltando ao tema e à tese do Supremo Tribunal de Justiça: a caracterização das transgressões à lei e à moral em crimes significativos ou não, passíveis ou não de punição, faço a pergunta: será correta a interpretação do Supremo? Ou ela nos levará a um descalabro maior, transformando tudo em banalidades, insignificâncias!
O noticiário dos jornais nos dias que se seguiram à crônica relatam a punição à dona da Daslu, por sonegação fiscal e o envolvimento da Construtora Camargo Correia em negócios escusos com o Governo. Seguramente são crimes a serem averiguados, e passíveis de punição. Mas retroagindo poucos anos atrás, o que dizer dos escândalos do “mensalão”, até agora isentos de averiguação efetiva e conseqüente punição e todas as outras denúncias contra figurões da política, muitas delas transformadas em processos a espera de julgamento ou da “conveniente” prescrição? . Esta constatação me lembra um conto de Machado de Assis em que um ladrão pé de chinelo é condenado com o voto de um jurado que, anos depois, tendo praticado uma enorme falcatrua, é julgado e absolvido. Nome do conto: Suje-se, mas suje-se gordo.
Onde estão a ética, os princípios morais, tão necessários para uma convivência harmoniosa entre as pessoas?
No boletim de julho/2003 do RCSP Caxinguí escrevi um artigo baseado em entrevista ao Estado de São Paulo, (Caderno 2 - 23/02/03), do pensador Tzvetan Todorov que transcrevo parcialmente: Respondendo a indagação do jornal : Os humanistas se perguntam porque o homem não atingiu no plano moral o mesmo nível de evolução por ele alcançado na ciência e nas artes. Qual seria sua explicação para o fenômeno? assim se manifestou Todorov: Minha explicação se baseia no fato de que essas evoluções não se ligam umas as outras. ..... Sabemos à saciedade, hoje, que uma coisa não puxa a outra, automáticamente. Nas ciências e nas técnicas intervém um efeito cumulativo, enquanto no homem tudo tem, a cada época, que recomeçar do zero”. ......tal como na lenda de Sísifo que não para de levantar o rochedo que cai em seguida e sempre. “O ser humano não será , jamais, perfeito, mas é susceptível à perfeição. Trabalhado, ele pode superar o egoísmo, deixar de ser interesseiro; isto se aprende.. E por aí se conta a história que recomeça sempre das grandezas e misérias da espécie humana. Todorov refere-se a Hitler e Stalin como perpetradores de crimes contra a humanidade e acrescenta: “Mesmo nas nossas sociedades democráticas assiste-se, por vezes, a esse exercício absurdo de se querer impor o bem pela força.” e completa:”Em suma, sou pelas intervenções pacíficas, porque é extremamente perigoso querer impor o bem por meio de ações militares”.
Todorov não estava sendo profético, porque a “coisa” estava na cara! Dias depois de sua entrevista o governo dos Estados Unidos invadia o Iraque!
O “Projeto Salve o Brasil” é uma forma de apresentar um caminho para recomeçar do zero ou para se evitar a recaída no zero. Como diz Todorov, “trabalhado, o homem pode superar o egoísmo”... etc. Levado às escolas e, mesmo, apresentado aos adultos, suas regrinhas de bem viver podem servir de alerta contra as barbaridades do nosso dia a dia, mostrar que a amizade é um bem fundamental, que o respeito ao próximo e à natureza representam o caminho para a paz e a conservação do meio ambiente. Como afirmei em artigos anteriores, o homem sabe distinguir entre o bom e o ruim e é livre para escolher entre o bem e o mal. Todorov afirma que não se pode impor o bem pela força nem se pode obrigar o homem a ser moral. E o que ocorre, freqüentemente, é que para se obter um benefício, uma coisa boa, a ação pode ser maléfica e, portanto, contrária a moral, o que corresponde a aceitar o aforismo: os fins justificam os meios. E aí surgem os Lalaus, Malufes, Sadans, Hitleres, Neros “et caterva”.
A proposta para aceitar e praticar sempre o bem, agir de acordo com a moral, pode e deve ser feita. Este é o escopo do Projeto Salve o Brasil. Rotary também foi criado com este propósito.
Mas como o ser humano é imperfeito, embora tenha sido criado para a perfeição, transcrevemos mais uma resposta de Todorov à seguinte pergunta feita pelo Estado: O que determina as escolhas políticas e morais das pessoas? Resposta: Os interesses de cada um em obter o maior benefício de suas ações para si e para os seus. O mesmo princípio vale para a política, pois um bom governo é aquele que contribui para o bem comum. ..... É moral, em seus atos, aquele que não põe o ego no centro do universo, mas no próximo. ... Embora afirmando que “não podemos obrigar as pessoas a serem morais” ...conclui que “podemos contribuir para a tomada de consciência de cada um, pregando que a via que o conduz à felicidade será mais direta e pacífica se nesse itinerário for também incluída a existência do próximo”.....”como somos seres substantivamente sociais, gregários, , nossa felicidade para ser segura e completa , passa pela felicidade que experimentam também os outros, as pessoas que amamos. Ser feliz sozinho é uma ilusão que só dura um instante”.
Criar condições para que uma conduta moral seja aceita e praticada é a missão do ser humano consciente de sua responsabilidade social. Isto pode ser feito, também, com a divulgação do Salve o Brasil. Assim estaremos fazendo diretamente algo para o próximo e, indiretamente, para nós, ou seja: poder, toda noite, apoiar tranqüilamente a cabeça no travesseiro. Isto nos leva a esperar quer a pergunta de Contardo Caligaris, “será que somos homens a altura desta esperança?” possa ter uma resposta afirmativa.
Sergio Giudice (foto)
autor e coordenador do Projeto Salve o Brasil

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